Formando Vendedores Consultivos #4: Vender produtos gringos é fácil?

Por Silvano Barbosa

Como sempre digo, não adianta ser um desafio vender, é preciso incluirmos mais características para deixar o desafio ainda maior. O fato é que sempre podemos incrementar o desafio da venda, e hoje vamos falar de vendas de produtos importados, pois isso geralmente é um desafio diferenciado.

Especificamente, vamos falar de representar, no Brasil, um fabricante estrangeiro. Normalmente encontramos esse tipo de desafio em sistemas de controle de acesso, incêndio ou CFTV e VMS, e aqui vem a primeira parte do desafio: essa empresa que está em terras brasileiras, tem escritório nacional onde você opera? Se sim, seu desafio já ficou um pouco mais leve. Faz um grande diferencial quando, mesmo sendo um produto importado, temos representatividade da instituição no Brasil. Isso inspira maior confiança por parte dos clientes e ao mesmo tempo nos permite levar de forma mais qualificada as nossas características nacionais aos nossos comandantes estrangeiros.

Falando em características nacionais, a segunda parte do desafio é: o produto está tropicalizado? Tropicalizado quer dizer acerca do produto estar preparado para o Brasil e suas várias características. Podemos analisar esses atributos como sendo:

• Físico: a grande variação de temperatura e umidade. Produtos que normalmente são mais usados acima da linha do Equador nem sempre suportam nossa variação de temperatura, há situações de 45° de exposição direta ao sol. Ao mesmo tempo, é possível que o produto vá ser utilizado em uma orla marítima, sujeita à maresia e toda a corrosão que ela carrega. Esses são apenas dois dos fatores. Há essa possibilidade? Quais os cuidados que devemos ter ao aplicar seus produtos nessas condições? É imperativo saber responder essas dúvidas.

• Sistemático: o software e a lógica dele atendem às nossas demandas internas? Por exemplo, e isso já me foi motivo de grande dificuldade: o sistema de controle de acesso contempla o uso de urnas/cofres nas catracas? Pode parecer a você que isso é um tanto bobo, claro que precisa, todo mundo usa, mas todo mundo nesse caso é o Brasil. Lá fora, no norte do globo, isso não se usa, e eles têm dificuldades enormes para entender a razão que precisamos disso. E após compreenderem, precisam alterar o sistema para contemplar essa função, e isso pode demorar bastante.

Se seu produto estiver tropicalizado, você já tirou mais um peso enorme de dificuldade das costas.

Terceiro desafio: idioma. Aqui cabe uma boa ressalva. Nós sabemos que traduzir um software é bem simples, nada demais. Sinto, mas não é bem assim. O global até que é simples, mas existem termos em alguns idiomas que são específicos ou mudam regionalmente dentro do mesmo idioma. Por exemplo, quando fui dar treinamento na América Latina e precisava me referir às catracas e torniquetes, era uma confusão controlada. Para nós catraca é catraca (dã!) e torniquete é aquela barreira vertical, como usada em estações de trem, estádios, indústrias, etc. No Chile e no Paraguai, catraca é torniquete. E nosso torniquete é torniquete em pé. Ou seja, se traduzirmos do espanhol direto, podemos confundir regionalmente. Então nesse caso, a tradução de um sistema precisa acompanhar esses regionalismos para ser eficiente ao máximo.

Seu produto está ok com relação ao idioma também? Você está perto de ser o mais sortudo entre nós! Parabéns. Uma vez que nosso produto vem de fora, temos que considerar ainda o quarto desafio: logística e tributos.

Sabe o que é NCM? Se sim, maravilha! Se não sabe, precisa aprender urgentemente. A classificação fiscal para importação de um produto pode fazê-lo ficar mais barato ou muito mais caro, e devido ao nosso maravilhoso manicômio fiscal, não é sempre uma ciência exata. A logística pode provocar, na pressa, o envio aéreo, ou na economia, envio marítimo, e isso pode modificar bastante o valor do produto, e em caso de demora, te fazer perder uma venda. Então, se seu produto já tem essa parte bem ajustada, estoque local e pronta resposta para uma remessa de importação, está ficando até fácil demais para você.

Em quinto, o desafio da vez é a parte referente ao treinamento. Isso refletirá diretamente na sua performance de vendas também. Um treinamento adequado e tropicalizado é fundamental. Porque o tropicalizado de novo? Porque uma característica relevante no Canadá não necessariamente é importante no Brasil. A cultura de segurança muda de região para região. Além de que, o treinamento é o momento de encantamento do pré-vendas, do técnico e se não estiverem claras as informações e ficar muita coisa pendente a ser esclarecida, o efeito será o contrário.

Agora vamos abordar algo que é o terror do vendedor: a POC, a famosa “Prova de Conceito”. É aquele termo que sabemos que é mandatório muitas vezes, mas que não gostamos nada. É basicamente deixar o cliente experimentar o produto para ele entender se resolve de fato o que ele precisa. Emprestamos o produto, damos suporte, ajudamos a fazer funcionar e ele nos devolve. Dando tudo certo, depois vem o pedido de compra.

Por que não gostamos muito disso? Porque isso é uma chaga no nosso mercado.

Mas por que é tão terrível assim para muitas empresas? Porque não é bem organizado.

Porém vou tocar nesse ponto específico no próximo mês (spoiler!). E esse foi o sexto desafio.

Agora vamos elencar:

• Sua empresa tem escritório ou representatividade local?

• Seu produto está tropicalizado?

• Seu produto está bem atendido acerca de idiomas?

• Vocês estão bem organizados quanto à logística e tributação?

• O treinamento oferecido está tinindo?

• Você tem produtos para POC e estão bem organizados quanto a isso?

Se você respondeu sim para todos os itens acima, rapaz, você já está quase zerando a vida, mas se todas foram não, reavalie, possivelmente você trabalha em uma instituição que não está muito preocupada com resultados no nosso país. Eu já passei por isso e é muito, muito ruim. Eu insisti, depois de anos, não adiantou nada e só gerou traumas.

Se foi um resultado parcial, é muito importante que você trabalhe junto à sua empresa para gerar “sim” em todos os itens. É um trabalho às vezes árduo, mas necessário. Ninguém quer abrir o sistema na frente do cliente e ter traduções toscas e malfeitas, ou mesmo prometer e não cumprir prazos de entrega, ou ter a surpresa de uma importação com valores acima do combinado.

O que isso tudo tem a ver com venda consultiva? Bom, absolutamente tudo. Pois precisaremos sempre considerar esses fatores caso trabalhemos com produtos de fora do Brasil.

Ok, Silvano, e no caso de trabalharmos com produtos nacionais? Bom, alguns desses itens de fato não se aplicarão, mas teremos diversos fatores de atenção: logística, substituição tributária, prazos de entrega, treinamentos coerentes, etc.

Opa, então não muda tanto na prática? Sim, muda, porque no caso de empresas internacionais, falar mais idiomas é obrigatório, não tem como progredir sem isso; também se interessar em conhecer diferentes culturas de segurança, de comportamento, etc.

Presta atenção, olhe ao redor: hoje temos diversos brasileiros comandando empresas de fora quando falamos do atendimento de América Latina e, muitas vezes, mundial. E sabe por quê? Porque se nós conseguirmos mandar bem e dominar as coisas falando de Brasil, conseguiremos igualmente lá fora. Seremos diferenciados, pois nosso país é muito amplo e com características únicas. É mais fácil dominarmos o Brasil e entender os demais, do que o contrário. Sua carreira no Brasil pode te levar mundo afora.

Convidado do mês: Felipe Ortiz, Regional Sales Manager da ISS – Intelligent Security Systems BR

Silvano Barbosa: Felipe, quais as principais dificuldades de trabalhar no Brasil produtos de origem estrangeira?

Felipe Ortiz: O nosso país é um grande berço de oportunidades, mas também um grande berço de “burocracias”. No meu ponto de vista, as maiores dificuldades em trabalhar produtos estrangeiros no Brasil são relativas às questões legais/tributárias. São dezenas, talvez centenas de regras de negócio complexas, que confundem até mesmo os mais experientes especialistas. Isso implica em complexidade desde o processo de precificação e posicionamento dos produtos, até às questões mais operacionais, como logística de distribuição e armazenagem em solo nacional.

SB: Quais os diferenciais que você enxerga que existem nesse mesmo cenário?

Felipe: Sempre que olhamos para os produtos estrangeiros que chegam ao Brasil, principalmente os oriundos dos mercados asiáticos, como China e Coreia (dentre outros), logo nos vem à cabeça a questão da competitividade. São mercados com grande capacidade produtiva e extremamente eficientes, portanto, é impossível não destacarmos como um diferencial o potencial de competitividade destas empresas para expansão de negócios no Brasil.

SB: Como você se preparou durante sua carreira para lidar com esse tipo de tarefa?

Felipe: Confesso que minha preparação ocorreu no campo de batalha. Foi aquela velha história de ter que trocar o pneu do carro durante o trajeto. Eu entrei no mercado de segurança em 2015, quando abri minha empresa FIT Network, depois vendida em 2019 em um projeto de fusão, e foi durante o processo de expansão da empresa – que cresceu três dígitos durante os três primeiros anos – que eu fui dando de cara com essas dificuldades. Olhando para a questão de “skills”, considero importante destacar que a experiência de já ter morado fora e a familiaridade com o idioma inglês foram fundamentais nessa trajetória.

SB: Por fim, olhando lá trás, se você pudesse fazer algo a mais, não diferente, mas a mais, que lhe traria maiores resultados hoje, o que seria?

Felipe: Eu talvez tivesse formado mais alianças estratégicas com parceiros de negócio em determinado momento. Muitas vezes, no calor do dia a dia, a gente tende a olhar para a nossa operação e dedicar as energias em solucionar os problemas dentro de casa – quase que como um senso de proteção. Mas o nosso mercado é muito amplo e cheio de gente de bem, com o intuito de trabalhar e fazer coisas significativas, e eu entendo que ter criado mais alianças estratégicas teria facilitado bastante o meu processo de evolução no mercado de segurança.

Silvano Barbosa
El Professor tem 30 anos de tecnologia, com certificações das mais variadas em TI e em Segurança Eletrônica, formado em análise comportamental e vendas, e desde sempre compartilhando conhecimento. Especialista em vendas e controle de acesso, é sócio investidor e co-criador do CT Hub. Através de treinamentos abertos e in company já formou mais de 200 pessoas no Brasil.

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