Roubo de cargas e o crime organizado: disfarce de Robin Hood
Por Eduardo Masulo
No Rio de Janeiro e em São Paulo concentra-se o impressionante percentual de 77% de roubos de cargas do País, segundo dados da Associação Nacional do Transporte de Cargas e Logística (NTC&Logística).
Este cenário gera enormes prejuízos financeiros e desafios diários são necessários para realizar entregas em determinadas regiões que, apesar de estarem dentro das grandes cidades, estão geograficamente isoladas, quando não sob domínios dos pseudo donos.
Muitas dessas regiões não são atendidas com políticas públicas e, com aumento da desigualdade social, surgem oportunidades perfeitas para serem ocupadas pelo crime organizado, que se apresentam com diferentes faces, seja como traficantes, narcotraficantes ou milícias.
O roubo de cargas não é algo novo na história, mas sem sombra de dúvidas é uma modalidade que fez o crime organizado se reestruturar, tornando-se um nicho altamente lucrativo e de significativa importância na cadeia criminosa para a capitalização de facções que se utilizam de cargas roubadas, ora para aferir rápida lucratividade, ora para distribuir para a população local, como se fossem o Robin Hood dos dias atuais e, assim, conquistam a simpatia de parte da comunidade beneficiada com as mercadorias.
As comunidades se tornaram verdadeiras fortalezas, onde os acessos possuem barricadas que controlam quem entra e impedem serviços básicos como a circulação de coleta de lixo, ambulâncias e segurança pública.
Entregas nestas localidades necessitam que as equipes de distribuição retirem as barricadas para a passagem dos autos de cargas, que, por vezes, são impedidas de serem feitas sob alegações de obrigatoriedade de pagamento de “pedágios”, como doações de cestas básicas para a população local sob forma de ação social.
Porém, uma vez no interior destas comunidades, as equipes se tornam alvos fáceis para ataques sem nenhuma garantia das supostas proteções oferecidas. Muitas são as empresas que cedem a essas ilusões e pagam essas doações.
Com uma nova forma de capitalizar, o crime organizado percebeu a oportunidade e passou a ser uma fonte alimentadora da informalidade, que cresce de forma descontrolada sob uma falsa imagem de legalidade e com alta aprovação da opinião pública, que sofre com o elevado desemprego, sem contar a ausência de fiscalização do poder público, transformando o crime do roubo de cargas em “comércio lícito” nas inofensivas barraquinhas de camelôs.
As empresas têm as suas marcas expostas e imagem ameaçada diante das vulnerabilidades. Logo, são necessárias ações para proteção das corporações, estudos internos, estratégias diferenciadas e processos robustos que sejam respeitados pelas áreas para blindar as operações logísticas.
Com este ambiente de turbulências, ter profissionais especializados na segurança corporativa é essencial para se manter competitivo, pois é preciso conhecimento para transformar a crise em oportunidades.
Isso inclui planos de entregas de maneira responsável e segura em localidades que o concorrente não consegue chegar, por exemplo. Ou seja, expandir os negócios com riscos controlados são diferenciais competitivos.
Por outro prisma, se reinventar é necessário e não há fórmulas mágicas. É preciso entender as dores de cada área para poder influenciar e despertar uma cultura de segurança, trabalhando a prevenção de perdas além das barreiras físicas dos Centros de Distribuições.
Entender e investir em treinamentos, auditar processos, controles internos e externos compõem as ações que são necessárias para a redução de prejuízos.
A sociedade que se beneficia de cargas roubadas que são distribuídas em comunidades não enxerga os malefícios, muito menos consegue entender que está alimentando um ciclo que se fortalece.
Por outro lado, a conta das empresas não para de crescer: Os custos operacionais se elevam com aquisições de tecnologias, uso de escoltas, taxas de gerenciamentos de riscos, fretes e dificuldades de aquisição de transportadoras e motoristas que aceitem os desafios – e isso terá impacto no preço final dos produtos.
Por fim, podemos entender que os processos possuem fragilidades nas mais variadas fases, que devem ser consideradas e corrigidas para evitar exposição de pessoas, produtos e marcas.
Trabalhar a ética nos mais diversos públicos e ambientes é necessário e disseminar uma cultura de segurança nas áreas é urgente. No caso de os processos não atenderem às operações, precisamos entender que não são motivos para serem ignorados, mas sim de serem reformulados. Metas agressivas não podem e não devem servir como justificativas para ignorar a ética.
Eduardo Masulo é consultor sênior na ICTS Security, empresa de origem israelense que atua com consultoria e gerenciamento de operações em segurança.
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