Simulações realísticas como treinamento para gestão de crises e emergências

Por Raphael Lobo

Currículo escolar, metodologias de ensino e tendências pedagógicas dividem, hoje, espaço na agenda de debates de conselheiros escolares, professores, pais e gestores do ensino, com outros assuntos como incidentes críticos, perda repentina ou suicídio, ataques com armas de fogo entre outros.

Crises e incidentes vão acontecer, fato. A questão é que gestores e professores podem ser responsabilizados, pessoalmente inclusive, se essas situações forem tratadas de forma inadequada ou se houver falhas em agir, quando a ação se faz necessária a fim de garantir a segurança.

Pesquisa realizada pela COSAFE (plataforma de comunicação para situações críticas), direcionada para pais, mães, cuidadores e professores, indicou que grande parte dos pesquisados considera o exercício regular de evacuação nas escolas relevante, mas não realizados nas instituições, mesmo com o aumento dos casos de violência e ameaças nas escolas.

A formação e treinamento de um comitê de crise que seja competente na resposta a uma emergência minimizam de forma exponencial os efeitos negativos das ocorrências. Certamente, todos possuem certa responsabilidade nas ações, prevenções e proteção no ambiente escolar (pais, professores, poder público e privado, etc…), mas a formação e o preparo de uma equipe dentro da instituição, que lidere as ações em um momento de crise, se demonstram como fator preponderante na facilitação da comunicação e consequente recuperação e restauração da organização.

Primeiro passo do processo é mapear onde se encontram os possíveis riscos de ocorrências dentro do ambiente escolar, para que se possam traçar protocolos de respostas a emergências e crise, meios de prevenção, mitigação (análise e administração) de riscos e contenção de danos, e por fim, formação do comitê de crise. Fase essa chamada de “DESPERTAR”. Onde o modelo de mundo de cada um é questionado e revisitado.

Um comitê de crise, dividido em funções, não cargos: administrativo, logística, operacional, gestão central, jurídico, relações públicas, secretariado, psicológico e apoios, é formado por um grupo de stakeholders que devem ter competências necessárias para executar ações determinadas em momentos de crise.  Competências que basicamente demonstrem como dominar linguagens, compreender fenômenos, enfrentar situações-problema, construir argumentação e elaborar propostas.

Mas e agora? Como mapear e identificar perfis e competências?

É possível perceber o uso da simulação enquanto uma metodologia de ensino por volta de 1590 A.C. e em modelos obstétricos do século 18. Por volta de 1920, o engenheiro Edwin A. Link foi o responsável por criar o primeiro simulador para a formação de pilotos. Em 1960, Asmund Laerdal elabora o primeiro manequim de uso clínico, sendo os primeiros passos da simulação com manequins. Em 1980, o experimento iniciado pela aviação passa a ser usado para capacitação e formação de profissionais da área da saúde (médicos, enfermeiros, fisioterapeutas, etc…).

No contexto da simulação, se contempla uma formação que possibilita o desenvolvimento do pensamento crítico, reflexivo, consciente e regulador dos próprios estados físicos e emocionais.

Se o objetivo é preparar pessoas seja para exercerem as funções de um comitê de crise, seja para responder a uma situação de emergência, a simulação promove três processos importantíssimos neste percurso. A autorregulação, que é um mecanismo interno e voluntário de controle que governa o comportamento, os pensamentos e os sentimentos pessoais, frente à uma situação positiva ou negativa. A autoeficácia, que é a percepção sobre a própria capacidade em realizar algo, constituída em experiência direta (experiências pessoais de erros e acertos), experiência vicária (observação de outras pessoas), persuasão social (feedback de pessoas significativas) e estados físicos emocionais que são informativos do quanto a pessoa é capaz. Por fim a regulação emocional, que é a capacidade do indivíduo controlar as próprias emoções.

Para cada objetivo determinado: formação do comitê de crise, treinamento e avaliação dos integrantes do comitê, mapeamento das ocorrências e riscos e treinamento em emergências; um modelo específico de simulação é aplicado.

A simulação realística, com ou sem o uso de simulador vivo (ator/atriz), é indicada para treinamentos, formação e avaliação da equipe. Esta simulação contém um cenário específico representando um caso real, para sua execução (um acidente com o ônibus em um passeio da escola, por exemplo), em que os participantes deverão se deslocar até o local do ocorrido, se assim for definido enquanto atividade, ou simplesmente pode ser desenvolvido no chamado “simulador de mesa”, em que os integrantes trabalharão o cenário apenas de dentro de uma sala, contemplando as funções do comitê citadas acima.

No desdobramento deste modelo, destaca-se também o game formato “ESCAPE ROOM“, que abrange jogos de Comportamento cujo tema central enfatiza trabalhos voltados às habilidades comportamentais, em que o facilitador busca trabalho em equipe, cooperação, relacionamento intergrupal, confiança, autoconfiança, dentre outros; e jogos de Processos, queobjetivam a ênfase nas habilidades técnicas e soluções de problemas, cujos colaboradores podem passar por processos simulados que buscam planejar, administrar o tempo e recursos, montar estratégias, tomar decisões, negociar e montar projetos. A base principal deste modelo é a corrida contra o tempo desvendando enigmas em que as chamadas “soft skills” (competências relacionais) são exigidas pela própria dinâmica do jogo. Competências como: escolher (tomada de decisão), comunicar, cooperar (trabalho em equipe), perceber, iniciar, delegar/mobilizar, superar pressões (resiliência), gerir o tempo. Modelo ideal para se trabalhar com o comitê de crise. Aqui não necessariamente trabalha-se um fato real, sendo mais uma prática do que uma simulação, no entendimento que as “soft skills” podem ser observadas em outras atividades direcionadas.

Para mapeamento de ocorrências, uma metodologia inspirada em uma prática criada para a medicina, é indicado o modelo OSCE (Observed Structured Clinical Examination), criado em 1975 no Reino Unido por Ronald Harden, e com registro de chegada ao Brasil em 1991, na Universidade Estadual de Londrina. O OSCE, Exame Clínico Objetivo Estruturado, consiste em uma série de estações em forma de circuito pelas quais o aluno é avaliado. Cada estação contém um cenário representando casos reais ou problemas práticos simulados em que o aluno demonstre habilidades e comportamentos específicos do próprio ambiente de trabalho. Para a área em que se está sendo discutida neste artigo, as estações representam situações em que cada participante passará em rodízio e encontrará situações que envolvam a ação de um simulador vivo, um vídeo, uma observação de um cenário, um recorte de jornal, entre outros. Estes cenários podem exigir interação ou não do participante.

A construção e escolha da simulação, o formato, cenário, ou seja, tudo que envolva a prática, dependerá sempre do cruzamento das necessidades da instituição, demandas sociais e a expertise de quem aplicará a atividade. O cuidado com o manejo das situações se prevalece devido à carga emocional que é criada e absorvida ou impactada diretamente nos participantes.

Quem vai fazer o quê e quando? Por que e onde? Perguntas que diariamente nos fazemos pensando em uma forma de proteger aqueles que nos rodeiam e que estamos orientados a cuidar. Qual direção tomar?  Uma equipe treinada sintonizada em suas funções, com suas competências técnicas e socioemocionais em dia, é tudo que qualquer organização gostaria de ter para minimizar prejuízos ao patrimônio, pessoas e sociedade. Simulações realísticas auxiliam na identificação de ocorrências, mapeando riscos e criando protocolos de ação, formando e treinando pessoas para integrarem comitês de crise. Venha se preparar também.

Raphael Lobo é Coordenador de Qualidade, Treinamento e Simulação do GRUPO MAGAV.

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