Paraíba testa novo monitoramento virtual de presos; a ideia é substituir as tornozeleiras eletrônicas
A Paraíba vai ser o primeiro estado do país a testar um monitoramento para presos via sistema operacional, que promete ser uma alternativa para a tornozeleira eletrônica, sendo mais barato, eficiente, discreto e adequado à ressocialização. O portal G1 teve acesso ao sistema e ao seu funcionamento, através de um teste que durou pouco mais de uma semana.
A nova ferramenta, chamada de IDBio, monitora o preso por reconhecimento biométrico facial e detecção de digitais e de voz. A tecnologia foi idealizada pelo juiz da Vara de Sucessões de Campina Grande, Bruno Azevedo – o mesmo que iniciou o uso de tornozeleiras eletrônicas em presos no Brasil, em 2007 – em parceria com o curso de direito da Universidade Estadual da Paraíba (UEPB) em Guarabira, e desenvolvida pela empresa de tecnologia Himni e o aplicativo Mundo Jurídico.
A tecnologia ainda está sendo aprimorada e deve funcionar em um aparelho específico, onde é retirado o sistema operacional do equipamento e é embarcado o sistema operacional do IDBio. “Ele não consegue utilizar nenhuma outra ferramenta no celular, nem fazer ligação”, explicou diretor de negócios e tecnologia Felipe Carvalho, da empresa responsável pelo monitoramento.
A cada alerta emitido pelo IDBio, o detento deve escanear a própria face, como se fosse tirar uma foto, para que o sistema identifique onde ele está e o que está fazendo. O sistema promete ser capaz de identificar alterações de personalidade que podem resultar em possíveis atos de delinquência.
Esses check-ins randômicos com reconhecimento biométrico e geolocalização são transmitidos em tempo real para o ambiente de uso exclusivo da Vara de Execuções Penais de João Pessoa, do Tribunal de Justiça da Paraíba.
A reportagem do G1 foi monitorada por nove dias, através do mesmo sistema que está sendo testado em pelo menos dois detentos do regime semi-aberto na Paraíba. Como a ferramenta ainda está em processo de atualização e também como o celular que a reportagem forneceu não tem a função do reconhecimento de digital, foi aplicado apenas o reconhecimento facial.
Para isso, a repórter fez o cadastro de cinco fotos, com e sem óculos, para que o reconhecimento durante as solicitações fossem facilitadas e não houvesse problema na captação da imagem. Esse mesmo procedimento acontece também com os detentos.
De acordo com Felipe, a central de monitoramento pode estabelecer uma certa quantidade de solicitações a serem feitas aos detentos por dia. Mas a pessoa que está sendo monitorada não sabe desse número. Pode ter cinco ou dez, ou até mais, solicitações durante o dia. Também não há horário para que ela seja feita. “O detento precisa estar disponível para responder a solicitação”, informou o diretor.
Teste do novo sistema de monitoramento
Durante o período de teste feito pelo G1, do dia 17 de julho ao dia 25 de julho, a solicitação falhou por pelo menos cinco vezes. O sistema fazia a solicitação, o pedido era aberto, mas em seguida a câmera não era acionada para fazer o reconhecimento. Segundo Felipe Carvalho, o problema aconteceu devido à versão do Android do celular.
A aplicação do IDBio é feita para uma versão mais recente. Por isso, não se cobra do detento que ele tenha um celular adequado ao sistema. Como outras notificações acabam surgindo em um celular com o sistema Android, sem o sistema IDBio embarcado, pode haver conflito nos alertas.
Outro problema encontrado foi uma falha na verificação facial. A foto que a repórter fez não foi compatível com a que estava cadastrada. O sistema solicitou uma nova verificação, mas o sistema de câmera não foi aberto. Nesse caso, no aplicativo, a verificação foi identificada como falha. “Existe alguns erros da versão mais atualizada também, mas o que acontece é que o teste foi uma simulação em aplicativo no aparelho”, explicou Felipe.
Durante o teste, foi percebido que algumas vezes a solicitação de verificação era feita e, duas horas depois, ainda era possível fazer o reconhecimento. No entanto, segundo Felipe, o sistema é trabalhado para que 60 segundos após a solicitação, se o apenado não fizer o registro da imagem, da voz ou da digital, o sistema computa como “não visualizado”. Em uma nova versão que já está sendo aprimorada, o sistema vai compor um cronômetro para ajudar o usuário na verificação.
Lembrando que o detento não tem a opção de sair do sistema. “O sistema mostra onde o apenado está, através do GPS, e quem está monitorando consegue criar um cerco. Se o penitenciado sai do perímetro, a central é avisada. Também tem uma função de chat, entre a central de monitoramento e a pessoa monitorada”, explicou Felipe. Inclusive, quando a verificação não é feita ou quando há falha, a central também é informada e pode comunicar a polícia sobre a falta de informação do detento.
Ainda não há uma decisão firmada entre Governo do Estado e empresa para saber como esse sistema funcionaria na prática.
Tecnologia do IDBio
O juiz Bruno Azevedo é idealizador e incentivador da nova tecnologia. “Tivemos a ideia de aprimorar essa tecnologia, criando um sistema capaz de realizar a leitura facial, o reconhecimento de voz e detecção de digital, através de um dispositivo similar a um aparelho celular”, afirmou o juiz.
O novo dispositivo ainda pode ajudar na ressocialização do preso, evitando os constrangimentos públicos que a tornozeleira muitas vezes causa, uma vez que é instalado em um celular e não estigmatiza o usuário como detento. “O IDBio é mais uma ferramenta de ressocialização que de monitoramento. Logo de cara, um grande benefício é o ganho na imagem. Tem também a questão ergonômica, de não ter o incômodo de usar a tornozeleira. Em terceiro lugar, o custo. Ele vai custar pelo menos 50% do que custa uma tornozeleira. E é ainda mais evoluído, porque tem outros dispositivos tecnológicos, tem maior segurança na proposta de controle”, pontuou o juiz.
O diretor Felipe Carvalho explicou que, no sistema, pode ser atribuído o tempo que o monitorando deve fazer os reconhecimentos facial ou digital, se tem algum projeto social que se aplica à penalidade daquela pessoa, pode emitir alertas de segurança, caso ele saia do raio da área geográfica delimitada para o mesmo, alertas de descarregamento de bateria do dispositivo, entre outros.
O gerente executivo do Sistema Penitenciário da Paraíba, João Paulo Barros, afirmou que ainda é necessário que sejam feitos experimentos para testar a eficiência do sistema, mas que todo investimento em tecnologia que possa auxiliar na execução das penas é “fundamental e viável”.
A aplicação é voltada para os regimes aberto e semi-aberto. No entanto, inicialmente, a proposta é que o sistema seja iniciado apenas com o regime aberto, já que a quantidade de presos é menor. Na Penitenciária de Segurança Média Juiz Hitler Cantalice, são cerca de 220 albergados. Se o sistema for implantado, eles deixam de dormir no presídio e passam a ser monitorados 24 horas por dia.
O primeiro teste começou a ser feito em maio de 2018. A previsão é cumprir entre 120 e 190 dias, podendo assumir um prazo maior ou menor. “Nesse momento a preocupação é que a ferramenta se torne funcional”, enfatizou Felipe.
Fonte: G1