Papel do distribuidor para as empresas estrangeiras

Por Silvano Barbosa

O Brasil é único em diversos aspectos. Muitas vezes não entendemos ou valorizamos nossa riqueza. Se tratando de segurança eletrônica, nosso valor está na pluralidade de empresas, tecnologias e profissionais, tanto em desenvolvimento de hardware como de software.

As companhias que chegam do exterior, em geral, têm dificuldade de lidar com nosso cenário. Em todos os segmentos da segurança eletrônica, seja CFTV, controle de acesso, alarmes ou incêndio, vamos encontrar algumas marcas que são onipresentes e que contam com um market share (participação de mercado) que abrange quase todo o globo. Em algumas regiões, a marca A ou B é mais forte, em outros a C ou a D, mas elas estão lá, dividindo o mercado mundial.

Porém, ao chegar ao Brasil, o jogo muda. E essa transformação acontece porque temos um parque fabril muito forte, versátil e criativo. Com isso quero salientar que nossos produtos sempre precisam entregar mais, ou seja, ser mais por menos. Por exemplo, integrar controle de acesso com automação predial, no exterior, não é algo usual. Não existem largos investimento nesse sentido. Geralmente são tecnologias que andam lado a lado, mas não se cruzam muito, salvo algumas pequenas integrações.

Mas aqui buscamos fazer com que sejam amplamente conectadas, assim como CFTV e intrusão, e se a nossa legislação permitisse, iríamos integrar incêndio com alguma coisa do pacote, só para aproveitar melhor a estrutura e os equipamentos, e na maioria das vezes, com um software customizado e bem alinhado em termos de design. Arrisco supor que isso é fruto, entre outros fatores, de nossos escassos recursos e o alto preço da tecnologia no nosso país. Somos naturalmente compelidos a fazer mais com menos, e juntando isso com a nossa inata criatividade e capacidade de realização, pronto, temos o caldo.

Nesse caldo o mercado nacional apresenta mais de 30 marcas de fabricantes de CFTV, ao invés de 5 a 10 empresas. Todos os segmentos no Brasil têm uma quantidade muito maior de concorrentes do que o mercado externo. Isso torna nossos negócios muito mais concorridos e exige que empresas de fora do país se desdobrem para nos atender. É preciso fornecer, no mínimo, produtos com excelentes preços e qualidades superiores, para conseguirem espaço em terras brasileiras. E nessa mistura, qual o papel do distribuidor nacional para essas fabricantes que embarcam no país?

Via de regra, um distribuidor que tem uma atuação local, regional ou nacional, é o grande responsável por manter a cadeia de distribuição funcionando. Ele conhece seus clientes de perto, tem maior conhecimento de sua saúde financeira, que tipo de empreitada direcionar a quem, quais produtos o cliente A absorve mais e melhor, qual o cliente de maior poder aquisitivo e qual integrador trabalha projetos de maior valor agregado, qual o que topa maiores desafios tecnológicos, e por aí vai. Ou seja, o distribuidor tem por natureza de negócio estar mais próximo e compreender melhor os interesses de seus clientes.

Até certo nível isso é bem difícil para o fabricante realizar essas tarefas, já que precisa manter o foco naquilo que domina, que é a confecção de produtos e a transmissão de conhecimento sobre esses equipamentos. Porém, no nosso mercado há um certo acesso livre do fabricante ao cliente final e ao integrador, o que faz com que diversas marcas estreitem essa relação, muitas vezes passando por cima do distribuidor que atende esse mesmo cliente. Há empresas que optam por manter saudável essa cadeia comercial tendo no distribuidor seu ponto de interação com os agentes locais, e há aquelas que optam por ir direto ao integrador ou cliente final. Não cabe aqui agora julgar qual está certo ou adequado, apenas entender um pouco dessas formas de trabalhar.

Para o fabricante que está fora do país o distribuidor tem um papel muito mais vital. Ele é a parte integrante da vida dessa companhia. Construir uma marca no mercado brasileiro, uma vez que você vem do exterior, é muito mais complexo e requer um distribuidor muito mais comprometido, porque ele passa a ser, mesmo que por apenas um período, o detentor do relacionamento da marca com todo o mercado, seja ele exclusivo ou não.

Toda a responsabilidade da capilaridade comercial, defesa da marca, auxílio na confecção da estratégia de mercado e treinamento local é divida com o distribuidor, pois o fabricante, uma vez sendo um imigrante, precisa aprender nossa forma de ser e fazer.

Cabe ao distribuidor dividir com a marca o trabalho de “tropicalizar” o produto – uma alusão ao trabalho de não só fazer a marca ganhar nome, mercado e força no país, como também ajudar a desenvolver o produto ao jeito Brasil de ser.

Há vários formatos possíveis para essa relação, isso vai depender da maneira que o fabricante trabalha e da forma que o distribuidor atua.

É como um casamento, e ao ler isso, muito de nós já sentimos um frio na espinha, mas calma. É como um matrimônio no sentindo de que essa é uma relação que começa com um certo nível de expectativa, e vai se ajustando no desenrolar do trabalho. Há momentos de surpresas boas e há os de decepção. Mas o que vai fazer com que seja um casamento de sucesso é a adaptabilidade de ambas as partes nesse processo. Muitas vezes o distribuidor precisará ser mais versátil porque a fábrica já tem padrões de atuação em muitos países, e terá dificuldades em trabalhar de forma diferente aqui. As vezes a fábrica é quem terá maior capacidade elástica.

Mas o fato é que será sempre um trabalho de parceria, o que é inerente para o crescimento das duas partes. Ambos irão batalhar e ceder quando preciso, para tornar a marca mais conhecida, atingir metas de vendas e dar o suporte necessário, sempre dentro dos parâmetros que, ao olhar o trabalho como um todo, seja positivo para os dois lados.

Já atuei como interface fábrica-distribuidor em companhias nacionais e internacionais, atuei ao lado do fabricante, do distribuidor, do integrador e até mesmo do cliente final, e ver o funcionamento desse mecanismo, ser testemunha de como isso ocorre em todos esses níveis, dá uma perspectiva bem clara de tudo.

A saúde de um produto e marca depende muito dessa relação ser positiva. Toda a cadeia do mercado sente quando isso é bem feito, abraçando os produtos dessa marca. E o contrário também é muito verdadeiro.

Silvano Barbosa atua na área de pré-vendas e treinamento da CDVI no Brasil.

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